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quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Evangelho II Domingo do Tempo Comum - Ano B - Jo 1, 35 - 42

Conclusão dos comentários ao Evangelho do 2º Domingo do Tempo Comum - Jo 1, 35 - 42 - Ano B
“Convém que Ele cresça e eu diminua”
Frei Manuel de Tuya, OP muito acertadamente comenta que esse trecho do Evangelho de hoje aponta uma continuação da missão do Batista, de anunciar a chegada do Messias, e de dar testemunho d’Ele. Do mesmo modo como antes procedera diante das multidões e do próprio Sinédrio, agora o faz perante seus dois discípulos: “Não os reterá, mas os orientará rumo a Cristo. Desfará seu ‘círculo’ para fazer crescer o de Cristo. É o tema desta passagem: ‘Convém que Ele cresça e eu diminua’ (Jo 3, 30)” (7).
O famoso Fillion vê esse trecho sob um outro ângulo e afirma que a exclamação de São João, “eis o Cordeiro de Deus”, foi suficiente para produzir nos dois discípulos, de maneira repentina, uma reação de maravilhamento (8). Já Maldonado manifesta-se favorável à idéia de que o Precursor julgava seus dois discípulos prontos para seguir o Messias (9).
III – André e João encontram Jesus
37 Ouvindo as suas palavras, os dois discípulos seguiram Jesus.
Desde toda a eternidade, Jesus vira esses dois discípulos e os amara; agora, com seus olhos humanos e sem Se deixar perceber, o Salvador os contempla de soslaio. Ele sempre quis atraí-los, mas, seguindo uma zelosa diplomacia, deixou a cargo de quem os formara tomar a iniciativa de encaminhá-los. De sua parte, Jesus não faz senão oferecer ao Precursor um pequeno pretexto, ou seja, passa diante de seus olhos.

O Batista demonstra uma vez mais sua total devoção ao Salvador, pois aproveita imediatamente a oportunidade. Ele teme que Jesus passe e não volte!
Quantas vezes esse mesmo Jesus se apresenta ao longo da caminhada de nossa vida! Ora é uma inspiração, ou um bom anseio pervadido de consolação, às vezes até uma dor de consciência e um arrependimento, ou exemplos de virtude ou de maldade aos quais assistimos... Sim, Jesus nos aparece de mil modos, e eis aqui o grande modelo diante de nós nesse Evangelho. Devemos ser ávidos dessas ocasiões para discernirmos as divinas insinuações de Jesus.
Fiéis aos ensinamentos de seu mestre, no entusiasmo pela figura do Cordeiro tão bem apresentada ao longo de enlevantes conversas e pregações, os dois discípulos resolveram segui-Lo. Conforme explica Frei Manuel de Tuya, “seguir alguém”, “ir atrás de”, era sinônimo, nos meios rabínicos, de ir à sua escola, ser seu discípulo (10). Portanto, seguiram-No nos dois sentidos da palavra, ou seja, fisicamente e com o intuito de passarem a ser seus discípulos.
Quantas vocações ficaram abandonadas pelos caminhos da História pelo fato de não reagirem como esses dois! Quantas perdições!
Da sua parte, Maldonado, com base em vários Padres da Igreja, ressalta a importância da pregação (11). Nesse versículo, Jesus colhe os primeiros frutos do rico plantio de João.
38 Jesus, voltando-Se para trás e vendo que O seguiam, disse-lhes: “Que buscais?” Eles disseram-Lhe: “Rabi (que quer dizer Mestre), onde habitas?”
Jesus nunca deixa de vir ao nosso encontro e jamais se nega a encorajar-nos nas vias do bem. Tão afetuosa e paternal é sua atitude com os dois que chega a nos comover. Ambos manifestam uma inocente ansiedade de dirigir-se a Jesus; entretanto, por respeito ou temor reverencial, não ousam abordá-Lo. Segundo a boa educação de todos os tempos, cabe a quem tem autoridade iniciar a conversa, e Jesus o faz com suma bondade, porque discerne o fundo do desejo de ambos e coloca-os à vontade.
“Rabi” é o título que Lhe conferem, e assim demonstram quanto anseiam por aprender sua doutrina. Em seguida Lhe fazem uma pergunta: “Onde moras?” Comenta Alcuíno a este respeito: “Não querem se beneficiar do magistério de forma passageira, e por isso Lhe perguntam onde vive para que, de futuro, possam ouvir suas palavras em segredo, visitá-Lo muitas vezes e instruir-se muito melhor” (12).
O Evangelho é perene e, por isso, também a nós Jesus pergunta: “Que buscais?” Ou seja, o que procuramos nos lugares frequentados por nós, em nossas companhias, amizades, ações, etc.? Buscamos a glória de Deus e de sua Santa Igreja? Será o Reino dos Céus, a edificação dos outros, nossa salvação, nossa santificação? Ou, pelo contrário, será nossa vanglória, nosso amor próprio, nossa sensualidade, nossos prazeres? É possível que nós não Lhe queiramos responder agora, porém, no dia do Juízo — particular e final —, deveremos prestar-Lhe contas exatas, diante dos Anjos e dos homens.
Imitemos os dois discípulos, e perguntemos a Jesus onde vive Ele atualmente. Imaginemos qual seria sua resposta. Certamente não O encontraremos nos espetáculos imorais, nem nas disputas vaidosas, etc. Antes de tudo, Jesus vive no Céu, como no tabernáculo, mas também no coração dos inocentes, de todos os que se mantêm na graça de Deus e fogem do pecado. Nós bem o sabemos...
39 Jesus disse-lhes: “Vinde ver”. Foram, viram onde habitava e ficaram com Ele aquele dia. Era então quase a hora décima.
A cortesia de Jesus é insuperável, pois poderia indicar-lhes o caminho e marcar-lhes um encontro para o dia seguinte. Pelo contrário, convida-os a segui-Lo, ou seja, já os aceita como discípulos.
Assim procedeu Jesus, conforme nos ensina São Cirilo, “para ensinar-nos primeiro que nas coisas boas não é louvável atrasar-se, porque o adiamento de algo bom é sempre um prejuízo. E, depois, para mostrar que não basta inteirar-se de qual é a casa, isto é, a Igreja fundada por Cristo, mas é necessário ir a ela com fé e observar com ânimo fervoroso o que nela se faz” (13).
Quem nos dera conhecer o conteúdo daquele sagrado convívio! “Que belo dia passaram! Que bela noite! Edifiquemos, pois, em nosso coração uma casa digna, na qual o Senhor venha habitar e nos instruir” — exclamou Santo Agostinho (14).
A nós também dirige Jesus esse convite cheio de benquerença. E assim procederá até o último minuto da História. Como é possível opor-Lhe resistência?
IV – Simão Pedro, fruto do apostolado de André
40 André, irmão de Simão Pedro, era um dos dois que tinham ouvido o que João dissera e que tinham seguido Jesus.
Os comentaristas são praticamente unânimes em frisar a humildade do Evangelista neste versículo, pelo fato de não se mencionar a si próprio como sendo o outro dos dois. A nosso ver, os bons anos de convívio muito estreito com a mais humilde de todas as criaturas, Maria Santíssima, havia-lhe arrebatado o coração no maravilhamento por essa excelsa virtude.
41 Encontrou ele primeiro seu irmão Simão e disse-lhe: “Encontramos o Messias”, que quer dizer Cristo.
Evidentemente, a longa conversa mantida com Jesus fizera crescer João e André na fé. Ambos deviam estar inflamados de zelo, entusiasmo e fervor em seu noviciado recém-começado. Logo surgem os resultados comprobatórios da autêntica realidade dessa fé: o apostolado. O Bem é eminentemente difusivo, as impressões sobrenaturais deviam ser muito fortes, o enlevo e veneração por Jesus estavam no mais elevado grau. A recordação das inúmeras conversas, previsões e comentários de João Batista sobre o Messias constituíram, para eles, um quadro lógico, belo e harmônico com a figura de Jesus. Era imperioso conquistar novos discípulos para o Messias. O primeiro que encontraram foi Simão e sobre ele devem ter despejado o desabafo de todas as suas místicas emoções e a concatenação de suas análises e conclusões (15). E qual foi a reação de Simão?
42 Levou-o a Jesus. Jesus, fixando nele o olhar, disse: “Tu és Simão, filho de João, tu serás chamado Cefas”, que quer dizer Pedra.
Conforme faz notar São João Crisóstomo, Pedro acreditou imediatamente no que lhe transmitiam e quis conhecer o quanto antes o Messias. Por isso deixou-se levar.
Jesus, por seu divino ver, já conhecia Simão desde toda a eternidade. Agora seus olhos humanos coincidiam no mesmo juízo. Deus e Homem lançam, em profecia, a pedra fundamental da futura Igreja. Nenhum dos neodiscípulos deve ter entendido o alcance daquelas palavras, que mais tarde se tornariam claramente explícitas, nestas outras: “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja” (Mt 16, 18).
Dois olhares marcaram a vida de Pedro: este inicial e o último, após o qual ele “flevit amare” (chorou amargamente) (Lc 22, 62).
V – Conclusão
É impossível não constatar, no Evangelho de hoje, a fundamental  importância do apostolado pessoal, direto, e sob o poder de uma hierarquia. Vê-se, já nos primórdios da constituição de sua Igreja, o Divino Redentor preocupado em estabelecer a Pedra-base de seu edifício. Por essa razão, em todo e qualquer sucessor de Cefas, nós devemos honrar essa Pedra, obedecendo com toda submissão às determinações da Igreja.
Roguemos a Maria, Mãe da Igreja, que jamais nos separemos nem um só milímetro da Cátedra Infalível de Pedro, em nossa fé, espírito e disciplina. Que Maria infunda em nossas almas a felicidade de crer no que a Hierarquia ensina, praticar o que ela ordena, amar o que ela ama, e percorrer as suas vias para chegar à glória eterna.
1) Decreto Apostolicam Actuositatem, n. 1.
2 ) Suma Teológica II-II, q. 3, a. 2, ad 2.
3) Discurso aos Homens da Ação Católica Italiana, 12/10/1952.
4) Vida de Nuestro Señor Jesucristo, BAC, 1954, p. 141.
5 ) Comentarios a los cuatro Evangelios, BAC, 1954, v. III, p. 125.
6) Apud Catena Aurea, Comentários ao Evangelho de S. João, cap. I, vv. 35-36.
7 ) Bíblia Comentada, BAC, 1964, v. II, p. 985 e 986. 8 ) Cf. Vida de Nuestro Señor Jesucristo, L.-CL. Fillion, Editorial Voluntad, 1925, Tomo II, v. I, p. 173.
8) Cf. Vida de Nuestro Señor Jesucristo, L.-CL. Fillion, Editorial Voluntad, 1925, Tomo II, v. I, p. 173.
9 ) Op. cit., idem.
10 ) Op. cit., p. 987.
11 ) Op. cit., p. 126.
12 ) Apud Catena Aurea, idem, vv. 37-40.
13 ) Apud Maldonado, op. cit. p. 128.
14 ) Apud Catena Aurea, id. ib. 15 )

15) Maldonado afirma que “pode-se considerar como algo certo que, do mesmo modo que André, João, o futuro evangelista, foi ao encontro de seu irmão, Tiago, e o levou ao Senhor. A união dos dois pares de irmãos, amigos e companheiros de pesca, faz suspeitar que os quatro viajaram na mesma caravana para serem batizados pelo Precursor e pensavam retornar juntos à Galiléia, quando sua boa sorte os conduziu à rústica tenda de campanha habitada por Cristo, decidindo ser discípulos, e com Ele regressaram à sua terra” (op. cit. p. 131).

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